Por que a monarquia é superior à
democracia
por Hans-Hermann
Hoppe, quinta-feira, 10 de setembro de 2009
N. do T.: o
artigo a seguir é uma transcrição de uma entrevista dada pelo professor Hoppe.
O sistema político que todos fomos ensinados a venerar
desde cedo - seja pelas escolas cujos currículos são controlados pelo governo,
seja pela mídia serviçal ao estado - é a democracia.
O que quero
argumentar aqui é que a antiga forma de governo, a monarquia, não só era muito
mais limitada, como também era mais pacífica, menos totalitária e mais propensa
ao desenvolvimento de um país do que a democracia.
Democracia x
Monarquia
O primeiro ponto a
ser enfatizado é: estados - sejam eles monárquicos ou democráticos - não
são empresas. Eles não produzem nada para ser vendido no mercado, e, como
tal, suas receitas não advêm da venda voluntária de bens e serviços.
Ao contrário:
estados vivem da coleta de impostos, que são pagamentos coercivos coletados sob
ameaça de violência.
Portanto, sendo um
anarcocapitalista, não sou apologista nem da monarquia e nem da
democracia. Porém, se tiver de escolher um desses dois regimes maléficos,
então é seguro dizer que a monarquia tem certas vantagens.
A razão é que os
reis eram normalmente vistos pela população como aquilo que realmente eram:
indivíduos privilegiados que podiam tributar seus súditos. E como todos
sabiam que não podiam se tornar reis, havia uma certa resistência dos súditos
contra as tentativas dos reis de aumentar impostos e expandir a exploração.
Sob a democracia,
surge a ilusão de que nós somos nossos próprios governantes, de que governamos
a nós mesmos. Entretanto, como já deveria estar
mais do que claro, sob a democracia também existem soberanos e os súditos
desses soberanos. Porém, o fato de que qualquer um pode potencialmente se
tornar um funcionário público é algo que, além de também ajudar a estimular a
ilusão de que governamos a nós mesmos, leva a uma redução daquela resistência
que havia contra os reis quando estes tentavam aumentar suas receitas
tributárias - afinal, o aumento da receita do estado ser-lhe-á favorável caso
você seja um dos soberanos.
Há ainda outras
desvantagens da democracia.
Na monarquia, o
rei pode ser visto como uma pessoa que considera o país sua propriedade
privada, e as pessoas que vivem nele são seus inquilinos, que pagam um tipo de
aluguel ao rei.
Por outro lado,
consideremos os políticos eleitos sob um sistema democrático. Estes
políticos não são os proprietários do país da maneira como um rei o é; eles são
meros zeladores temporários do país, por um período que pode durar quatro anos,
oito ou mais.
E a função de um
proprietário é bastante diferente da função de um zelador.
Imagine duas
situações distintas: na primeira, você se torna o proprietário de um
imóvel. Você pode fazer o que quiser com ele. Você pode morar nele
para sempre, você pode vendê-lo no mercado - o que significa que você tem de
cuidar muito bem dele para que seu preço possa ser alto -, ou você pode
determinar quem será seu herdeiro.
Na segunda situação, o proprietário desse imóvel
escolhe você para ser o zelador dele por um período de quatro anos. Nesse
caso, você não pode vendê-lo e não pode determinar quem será seu
herdeiro. Porém, você ganha um incentivo novo: extrair o máximo possível
de renda desse imóvel durante o período de tempo que lhe foi concedido.
Isso implica que,
na democracia, o zelador temporário é incentivado a exaurir o valor do capital
agregado do país o mais rápido possível, pois, afinal, ele não tem de arcar com
os custos desse consumo de capital. O imóvel não é dele. Ele não
tem o que perder com seu uso irrefletido. Por outro lado, o rei, como
proprietário do imóvel, tem uma perspectiva de longo prazo muito maior que a do
zelador. O rei não vai querer exaurir o valor agregado de seu imóvel o
mais rapidamente possível porque isso se refletiria em um menor preço do
imóvel, o que significa que sua propriedade (o país) seria legada ao seu
herdeiro a um valor menor.
Portanto, o rei,
por ter uma perspectiva de longo prazo muito maior, tem o interesse de
preservar - ou, se possível, aumentar - o valor do país, ao passo que um
político em uma democracia tem uma orientação voltada para o curto prazo e quer
maximizar sua renda o mais rapidamente possível. Ao fazer isso, ele
inevitavelmente irá gerar perdas no valor do capital de todo o país.
Guerras
As guerras sob um
regime monárquico tendiam a ser, como certa vez descreveu Mises, guerras
exclusivamente entre soldados, ao passo que as guerras feitas por democracias
envolvem o homicídio em massa de civis em uma escala jamais vista na história
humana.
Essa diferença tem
a ver novamente com o fato de que os monarcas consideram o país como sua
propriedade. Tipicamente, os monarcas faziam guerras para resolver
disputas de propriedade. "Quem é o dono de determinado castelo? Quem
é o dono de determinada província?" O objetivo de uma guerra
monárquica sempre era limitado e específico.
Já as guerras
feitas por democracias tendem a ser guerras ideológicas. Ora quer-se liberar um
país de alguma ditadura, ora quer-se converter um país a uma determinada
ideologia. E é difícil determinar quando tal objetivo foi de fato
atingido. A única maneira certa de atingi-lo é matando toda a população
do país que se está tentando invadir ou ocupar.
Um monarca,
obviamente, jamais teria tal interesse, pois ele quer adicionar - ao invés de destruir
- uma determinada província, uma determinada cidade ou mesmo um determinado
castelo à sua propriedade privada. E, para atingir esse objetivo
satisfatoriamente, é de seu interesse causar os mínimos danos possíveis -
afinal, de nada adianta adquirir bens destruídos e sem valor.
Portanto, embora
para um monarca fosse mais fácil começar uma guerra, também lhe era mais fácil
determinar quando o objetivo havia sido atingido, o que dava fim à guerra.
Nunca houve alguma
motivação ideológica que levasse diferentes reis a guerrearem entre si, ao
passo que as democracias - assim como as guerras religiosas - são um conflito
de civilizações, um conflito de sistemas de valores praticamente impossível de
se controlar.
Ademais, as
guerras iniciadas por reis eram vistas pelo público meramente como um conflito
entre monarcas, uma vez que os reis geralmente dependiam de voluntários para
lutarem suas guerras. Já nas democracias, todo o país participa da
guerra, todos os seus recursos são forçosamente desviados para o esforço da
guerra e nele são exauridos.
Com a democracia
surgiu também o serviço militar obrigatório - uma situação típica em várias
democracias atuais -, no qual os indivíduos são obrigatoriamente recrutados e
forçados a ir às guerras. O argumento utilizado para tal escravidão
mortal é: "já que agora você tem uma participação no estado (afinal,
estamos em uma democracia), você também tem de lutar as guerras do
estado".
Já sob uma
monarquia as pessoas não tinham uma participação no estado; o estado era visto
como pertencente ao rei, sendo os cidadãos uma entidade completamente separada
do estado. Por causa disso, o envolvimento da população nas guerras
monárquicas era muito limitado.
Nacionalismo
Erik von
Kuehnelt-Leddihn costumava dizer que uma das coisas de que ele mais gostava nos
regimes monárquicos era o fato de que havia muito menos nacionalismo - o
nacionalismo, obviamente, é uma característica democrática dos séculos XX e
XXI.
Sob a monarquia
não havia nada de errado em ser, por exemplo, um nobre germânico e ir trabalhar
para a czarina da Rússia. Pessoas que lutavam em vários lados também não
eram consideradas "traidoras" da pátria.
Foi com a ascensão
da democracia que tivemos a ascensão da beligerante e inauspiciosa filosofia do
nacionalismo.
As altas
aristocracias foram, por assim dizer, as pessoas mais
"internacionais" da história da civilização. Praticamente todos
os altos nobres eram interrelacionados com aristocratas de outros países.
O Kaiser alemão, por exemplo, tinha relações com os monarcas britânicos e
russos. Todos os soberanos de Europa também tinham, de alguma forma
indireta, ligações com Maomé - logo, com países islâmicos.
Quando havia
contendas entre monarcas, estas eram vistas como brigas entre famílias.
Sendo assim, o sentimento de nacionalismo era impossível de surgir - até
porque, novamente, os nobres eram a mais internacionalista das classes de
pessoas que existiam. Portanto, sentimentos nacionalistas eram totalmente
estranhos e atípicos para uma classe como aquela.
E
isso certamente poupou várias vidas e evitou muito empobrecimento.
Hans-Hermann
Hoppe é um membro sênior do Ludwig von Mises Institute, fundador e
presidente da Property and Freedom
Society e co-editor do periódico Review of Austrian Economics. Ele recebeu
seu Ph.D e fez seu pós-doutorado na Goethe University em Frankfurt, Alemanha.
Ele é o autor, entre outros trabalhos, de Uma
Teoria sobre Socialismo e Capitalismo e The
Economics and Ethics of Private Property.