sábado, 7 de setembro de 2013

Perguntas frequentes, respostas claras



Perguntas freqüentes, respostas claras:

- O que é Parlamentarismo?
- O que é voto distrital misto?
- O que é recall?
- O que é Parlamentarismo Monárquico?
- O Monarca manda nas pessoas?
- Monarquia tem algo a ver com escravidão?
- Monarquia é atraso ou avanço?
- O Monarca é só um ‘enfeite’?
- É caro para o País e para o cidadão sustentar a Monarquia?
- O Brasil já foi uma Monarquia; isso dava certo no País naquela época?
- Por que o Brasil se tornou uma república?
- Basta instaurar o Parlamentarismo Monárquico no Brasil para que o nosso país melhore?
- O que é o CMMOC?
- Quais são os objetivos do CMMOC?
- Por que e como se filiar ao CMMOC?
- O que eu mesmo posso fazer pela idéia da implantação do Parlamentarismo Monárquico no nosso País?


- O que é Parlamentarismo?

 R: Parlamentarismo é um sistema de governo no qual a chefia de estado e a chefia de governo estão com pessoas diferentes. A chefia de estado (presidente ou monarca) é responsável pela representação do país e pela eventual queda do governo (nos termos ditados pela constituição). A chefia de governo é feita por um primeiro-ministro, eleito pelo Parlamento e cujo mandato dura enquanto tiver a maioria do parlamento. Aqui já temos uma vantagem: o governo nasce da maioria, e não precisa fazer maioria (adeus, mensalão).


- O que é voto distrital misto?

 R: O voto pode ser majoritário, distrital puro e distrital misto. Majoritário é o sistema atual, em que um deputado federal, para se eleger, precisa de “x” votos. O resultado é que ele precisa fazer campanha por todo um estado, distanciando-se de sua base política original,  e ter custos muito maiores de campanha, o que facilita a corrupção. No voto distrital puro, todos os candidatos são eleitos por distritos, ou seja, o candidato somente pode fazer campanha e ser eleito por pessoas de uma certa região, por exemplo, a grande BH. Isso desonera a campanha e força os candidatos a manterem vínculos com suas verdadeiras bases eleitorais. Contudo, em sua forma pura o voto distrital pode favorecer o fortalecimento dos caciques políticos e a formação dos famigerados “currais eleitorais”. Já no sistema distrital misto parte dos deputados é eleito de forma majoritária, através de listas partidárias e parte através do sistema distrital. Na parte majoritária os votos não vão para o candidato, e sim para o partido, que conseguindo um número mínimo de votos elege um deputado da lista. Isso é uma poderosa ferramenta de fidelização partidária, considerando que quebra a mentalidade de “salvador da pátria” e o voto vai para o partido, que representa um conjunto de idéias. Por outro lado, para constar na lista, o candidato terá de trabalhar pelo partido, o que desestimula o oportunismo. Na parte distrital, o voto é dado diretamente para o candidato.


- O que é recall?

 R: Recall é um mecanismo que permite ao povo literalmente cassar o mandato de um mau deputado, independentemente de CPI’s, processos ou queda de parlamento. Basta que os cidadãos de um distrito consigam um dado número de assinaturas e encaminhem ao Parlamento, e o deputado em questão é expurgado. Lembra daquela propaganda “você é o patrão?” Pois bem, com o recall, seria verdade.


- O que é Parlamentarismo Monárquico?

 R: O Parlamentarismo em si pode funcionar em uma Monarquia ou em uma república. Parlamentarismo Monárquico é o sistema que funciona tendo como chefe de estado um Monarca, seja ele Rei ou Imperador. Em primeiro lugar, basta dizer que o Parlamentarismo nasceu nas Monarquias, e funciona melhor quando a elas associado. Por quê? Simples: um Monarca não pode ter partido político, logo as chances de conflito partidário entre ele e o Primeiro-Ministro são praticamente nulas. O Monarca é preparado desde a infância para a chefia de estado (alguém já ouviu falar de algum curso para presidente?). O Monarca não precisa ser eleito e, portanto, não significa custos elevadíssimos de eleição e, em conseqüência, não significa “rabo-preso”.


- O Monarca manda nas pessoas?

 R: Não!!! Nas escolas por “alguma razão” (programação institucional), ensinam-nos que monarquia é igual a absolutismo... pergunte, por exemplo, ao povo norueguês se ele troca a democracia dele pela nossa... Bem, o fato é que em Monarquias Parlamentaristas o Monarca não pode criar leis e não exerce o poder executivo, logo, não pode, de nenhuma forma, tolher as liberdades individuais. Ele é antes de tudo um símbolo da Nação e de seus valores e um fiscal dos governos, através do exercício do Poder Moderador.


- Monarquia tem algo a ver com escravidão?

 R: A resposta é NÃO!! Isso é outra mentira republicana! Todas as leis que iniciaram e terminaram o processo de Abolição foram criadas durante a Monarquia, o Brasil não foi o último país do mundo a abolir a escravidão e muito menos aquele onde ela mais durou, entre a independência e a Libertação. O último país americano a abolir a escravidão foi Cuba, 10 anos após o Brasil, e o país onde ela mais durou, entre a Independência e a implantação definitiva da Abolição, foram os Estados Unidos (sim, lá a escravidão durou 23 anos a mais que aqui!), e mesmo assim lá custou uma guerra. Vejam bem, ambas repúblicas.

Último país das Américas a abolir a escravidão: CUBA (república)
Tempo de duração da escravidão:
Estados Unidos: 89 anos (república)
Império do Brasil: 66 anos (monarquia)

Pior: a escravidão ainda existe, no Sudão... que também é república!!! Bem, na época do Plebiscito de 1993, os republicanos presidencialistas colocaram um famoso ator global afrodescendente dizendo que, se a Monarquia voltasse, a escravidão voltava junto. Mentira deslavada. Um sistema que precisou usar uma mentira tão grande para se manter tem embasamento?


- Monarquia é atraso ou avanço?

 R: Basta observar que a maioria das nações mais desenvolvidas, ricas e modernas do mundo são Monarquias Parlamentaristas!!! Trata-se de outra colocação programada a de que Monarquia é atraso e república é progresso... interessante... A república é uma invenção grega de mais de 2500 anos, e é associada ao novo, já a monarquia não teocrática, cujos moldes têm menos de 1600 anos, é retrocesso. Por aí já começa a contradição. Agora, dizer que um sistema que funciona é atraso e dizer que o outro que não funciona é progresso, independentemente de data de surgimento, é no mínimo ilógico, não?


- O Monarca é só um ‘enfeite’?

 R: Outro mito cuidadosamente cultivado em nossas escolas. O Monarca não legisla e nem exerce o poder executivo, mas tem atribuições importantíssimas. Claro que essas atribuições variam conforme o país, mas as mais comuns seriam: o poder de destituir o Primeiro-Ministro e o Parlamento, convocando novas eleições, nos termos da Constituição (sim, em uma Monarquia Parlamentarista o Congresso teria caído nos escândalos do Mensalão e das sanguessugas), e o poder de convocar referendos e plebiscitos (ora, não é interessante consultar o povo diretamente em temas importantes?). O caráter representativo e a sanção de leis seriam funções secundárias.


- É caro para o País e para o cidadão sustentar a Monarquia?

 R: Acredite se puder, mas é muito mais caro sustentar uma república que sustentar uma monarquia, ao contrário do mito que tão cuidadosamente nos ensinam nas escolas... na república brasileira, caro amigo, você sustenta o presidente, todos os ex-presidentes (e ex-presidente é todo aquele que ocupou o cargo um único dia que seja, vice-presidentes e presidentes da Câmara inclusos), todas as viúvas de ex-presidentes e, pasme! Você paga para cada ex-presidente SEIS ASSESSORES, mesmo que o ex-presidente em questão não ocupe nenhuma função agora. Em uma monarquia,      SEMPRE são sustentados apenas o monarca e seu herdeiro. Talvez seja por isso que gastamos seis vezes mais do que gastam os britânicos para sustentar sua Monarquia, a mais cara de todas. Se lançarmos em conta as outras monarquias, todas mais baratas, é aí que a nossa conta se mostra ainda mais cara que a deles... veja a comparação aqui.


- O Brasil já foi uma Monarquia; isso dava certo no País naquela época?

 R: Isso deve ser bem esclarecido. Qualquer país hoje é melhor do que era há um século, e isso se aplica ao Brasil. Para se dizer se o país era “melhor”, é preciso que seja feita a comparação com outras nações do mesmo período histórico. Os registros mostram que durante todo o Período Imperial a inflação girava em torno de 2% ao ano, coisa que não se repetiu na república. Os dados mostram que a diferença entre o maior e o menor salário, nos tempos da Monarquia, era de 12 vezes, e não de 65 vezes, como hoje. A renda per capita do Brasil equivalia a cerca de 90% da renda per capita americana, e não era mais de 11 vezes menor, como hoje. Em termos de democracia, apesar do voto censitário da época, 13% da população brasileira votava, contra valores entre 6 e 9% nos EUA e Inglaterra, as nações que eram a “coqueluche” de então. Éramos uma Monarquia, mas se podia falar livremente de república e a liberdade de imprensa era plena, enquanto sob o regime republicano por mais de um século foi crime questionar o sistema e a imprensa teve sua liberdade tolhida em diversos graus ao longo desse tempo. Nenhuma nação estrangeira ousava interferir nos assuntos nacionais, enquanto que no regime republicano chegou-se a tolerar que o mandatário francês De Gaule, em solo brasileiro, dissesse que nosso país não era sério... Com esses dados, somos forçados a dizer que sim, em termos comparativos e adequados a cada momento histórico o Brasil era, sim melhor sob a Monarquia que sob a república.


- Por que o Brasil se tornou uma república?

 R: Ao contrário do que se diz, a república não era um movimento forte no país, e nem era composta majoritariamente por elementos liberais, e sim conservadores. A idéia inicial adveio de um espírito de imitação da terceira república francesa e dos EUA (sempre a mania de copiar). A Lei Áurea, que redimiu os negros da mácula horrível da escravidão, fez com que os antigos senhores de escravos, revoltados por não serem indenizados pela perda de “seus plantéis”, aderissem aos planos republicanos, mais por vontade de alçar ao poder e “se vingar” do Império. A república não foi implantada no país pela vontade da população, mas sim por um levante militar que não representava nem 2% das Forças Armadas do país. A população a tudo assistiu bestificada, como atesta o próprio republicano Aristides Lobo. Tal era a popularidade da Monarquia, que o Partido Republicano jamais conseguiu mais que três cadeiras no Congresso e, após o golpe de 1889, havia o plano de legitimar a república através de um plebiscito, mas que logo foi arquivado e substituído pela ilegalidade dos monarquistas, quando se constatou que a Monarquia ganharia com ampla vantagem...


- Basta instaurar o Parlamentarismo Monárquico no Brasil para que o nosso país melhore?

 R: Ao contrário dos políticos e partidos republicanos, não somos vendedores de ilusões. Nunca será um aspecto isolado que resolverá todos os problemas de nosso país. O modelo de governo apenas gera mais condições para que a população participe mais do processo político do país e dá a ela ferramentas para que possa exigir mais dos governantes. Tais condições, por si só, justificam a troca de sistema, mas sozinhas não resolvem todos os problemas. Contudo, se o povo tiver as ferramentas de cobrança, terá meios de exigir as mudanças e ética necessárias ao desenvolvimento de nosso país. Coisa que boa parte de nossos políticos gostaria de evitar a todo custo...


- O que é o CMMOC?

 R: O CMMOC é o Círculo Monádrquico de Montes Claros. É uma ONG que tem por finalidade esclarecer a população em geral acerca das vantagens do sistema monárquico e mostrar a nosso povo os abusos que caracterizaram a república brasileira. Tem também o objetivo de congregar os monarquistas mineiros e gerar ações coordenadas que visem propiciar ou facilitar a implantação do Parlamentarismo Monárquico no Brasil.


- Quais são os objetivos do CMMOC?

 R: Promover ações de esclarecimento da população mineira sobre a Monarquia Parlamentarista e suas vantagens. Reunir os monarquistas mineiros e promover ações coordenadas de caráter educativo e/ou político que levem à implantação desse sistema no país. Interagir com outras organizações monarquistas para discutir propostas comuns. Implantar a Democracia Coroada em nosso país, em suma.


- Por que e como se filiar ao CMMOC?

 R: Filiando-se ao CMMOC você poderá aprender mais sobre o Parlamentarismo Monárquico, interagir com monarquistas de todo o Estado e propor suas ações e idéias para a consecução de nossos objetivos. Também poderá tomar parte de ações e eventos promovidos pelo CMMOC, gerando mais efeitos que a ação individual isolada.


- O que eu mesmo posso fazer pela idéia da implantação do Parlamentarismo Monárquico no nosso País?

 R: A primeira coisa é se informar. Ao contrário do que muitos pensam, os monarquistas não são saudosistas deslumbrados com títulos de nobreza e histórias de reis, e sim pessoas esclarecidas que conhecem os mecanismos políticos que podem melhor servir ao país. O sistema educacional e a propaganda republicana de tudo fizeram para apagar a memória monárquica de nosso país, logo, não espere que nossas idéias sejam pronta e facilmente recebidas. Deve-se estar bem armado de fatos, argumentos, lógica e paciência. Após você “se formar” dentro da lógica e fatos monárquicos, deve ter a coragem de mostrar as idéias sempre que se mostrar a ocasião, ou seja, sempre que se falar em política. Se conhecer algum candidato que seja monarquista, vote nele. Cobre ética de todos os governantes. Filie-se a alguma organização monarquista, e colabore com idéias, ou produza textos, promova ou participe de eventos em que se fale de Monarquia. O campo de ações é grande. Lógica, conteúdo e fatos já temos. Agora, precisamos de mãos para a ação.




Monarquia X República



Monarquia X República. Por Otto von Habsburg


Enfocamos aqui o aspecto formal de Estado – a questão monarquia X república – que costuma ser discutido a partir de um ponto de vista mais emocional que racional. O debate gira em torno de argumentos ad hominem. Uns poucos ocupantes de tronos reais de reputação duvidosa são enumerados e apresentados como demontrativos característicos da monarquia. Os defensores da monarquia não fazem melhor. Apontam políticos profissionais corruptos, dos quais existe um número suficiente, e proclamam que tais são um resultado inevitável da constituição republicana. Nenhum dos dois argumentos é racional. Sempre houve monarquias boas e más, repúblicas boas (como a Suíça) e outras que estão longe de equiparar o mesmo padrão.
Toda instituição humana tem, a princípio, bons e maus aspectos. Enquanto este mundo for habitado por homens, e não por anjos, crimes e erros continuarão a ocorrer . . . Republicanos são afeitos ao reclame de que o regime monárquico subentende o poder da aristocracia. Monarquistas, por outro lado, enumeram as dificuldades econômicas, as cargas tributárias e a interferência do Estado na vida privada, nas repúblicas atuais, e comparam tal estado de coisas com a liberdade e o bom andamento econômico ocorrentes nas monarquias de pré 1914. Nem um nem outro argumento é convincente. Ambos recorrem ao velho artifício midiático de comparar resultados oriundos de causas completamente diferentes. Quem seja honesto comparará monarquias atuais com repúblicas atuais, tornando, assim, evidente que a aristocracia hereditária não ocupa nas monarquias maior parcela das posições de comando que nas repúblicas, e que todos esses estados, qualquer que seja sua forma de governo, são igualmente afetados pelos sérios problemas de nossos dias.
Republicanos costumam, também, aduzir que a monarquia é uma forma de governo pertencente ao passado, ao passo que o republicanismo é algo do futuro. Basta um ligeiro conhecimento de história para refutar tal argumento. Ambas as formas existem desde tempos remotos (embora os períodos monárquicos tenham-se geralmente prolongado consideravelmente mais que os republicanos). Em termos de exemplos, seria um contra-senso considerar instituições como as que vigoraram outrora na velha Grécia, Roma e Cartago, como formas de governo do futuro.
Em termos de discussão objetiva, devemos também pôr essa questão em seu devido lugar, em nossa hierarquia de valores. Não é por acaso que falamos de uma “forma” de governo. Há uma grande diferença entre a “forma” e o “conteúdo” – ou propósito – do estado. Este último é sua essencial raison d’etre, seu verdadeiro espírito. O anterior corresponde à forma corpórea de uma existência viva. Um não pode, certamente, viver sem o outro, mas em uma lúcida hierarquia de valores o espírito ocupa um lugar mais alto que o corpo.
O propósito essencial do estado, seu “conteúdo”, é enraizado numa lei natural. O Estado não é um fim em si mesmo; ele existe em prol de seus cidadãos. Ele não é, portanto, a fonte de toda lei (conceituação, no entanto, ainda amplamente aceita), nem é todo-poderoso. Sua autoridade é circunscrita aos direitos de seus cidadãos. Ele é livre somente para atuar nos campos que estão fora da livre iniciativa dos mesmos. O estado sempre é, portanto, o servidor da lei natural. Sua função é dar efeito prático a essa lei, e nada mais.
Se a missão do Estado é a realização prática de uma lei natural, a forma de governo é um meio pelo qual a comunidade procura alcançar este objetivo. Não é um fim em si mesma. Isto explica a importância relativamente subordinada de sua questão geral. Sem dúvida, é de muita importância a escolha dos meios certos, desde que tal escolha vá determinar se o fim está ou não sendo alcançado. Mas a única coisa permanente na vida política é a lei natural. A busca de realizar tal lei na prática terá frequentemente que levar em consideração as circunstâncias localizadas. Falar numa forma de governo eternamente válida, justa em quaisquer circunstâncias, demonstra ignorância e presunção.
A partir disto, conclui-se que é infrutífero tentar determinar – sobretudo a partir de falsas premissas filosóficas – o valor objetivo de uma ou outra forma de governo. A discussão só será fruitiva se nós tivermos em mente a finalidade que qualquer forma é designada a servir. Esta não é, portanto, uma questão de se investigar que valor associaremos às monarquias ou às repúblicas, como tal. O que temos de perguntar a nós mesmos é que forma oferece as melhores chances de salvaguardar a lei natural, dentro das condições atuais.
Uma vez esclarecido este ponto, podemos passar a dois outros problemas, que têm sido frequentemente introduzidos nesta discussão e ameaçam envenenar a atmosfera geral. Há constante controvérsia sobre a relação entre monarquismo, republicanismo e democracia. Aqui nos deparamos novamente com o turvo pensamento característico da nossa era de slogans e propaganda. O conceito de democracia tornou-se infinitamente elástico. Na Rússia, tal é compatível com liquidações em massa, polícia secreta e campos de trabalho. Na América, por outro lado – e ocasionalmente na Europa – teóricos políticos são frequentemente inábeis para distinguir entre republicanismo e democracia. Além disso, ambas as palavras são usadas para designar concepções e características que fogem ao campo da política e pertencem à esfera econômica e social. Deve, por conseguinte, ficar claro que, falando em termos gerais, democracia quer dizer o direito do povo de participar na determinação de seu próprio desenvolvimento e futuro.
Se aceitamos tal definição, veremos que nenhuma das duas formas clássicas de governo é, por natureza, ligada à democracia. Democracia pode existir dentro de ambas as formas, assim como existem tanto repúblicas quanto monarquias autoritárias. Os monarquistas, realmente, costumam considerar as funções da democracia melhor dentro de uma monarquia que numa república. Se olharmos para a Europa atual, há, certamente, alguma verdade nesse argumento, embora sua validade possa restringir-se a tempo e espaço. Ao mesmo tempo, é preciso observar afora que em pequenos estados que estão fortemente enraizados em suas tradições, tal como a Suíça, democracia e republicanismo podem coexistir com sucesso.
Ainda mais acalorada é a discussão de monarquismo e socialismo, e republicanismo e socialismo. Isto se deve, em grande parte, ao fato de que nos países de língua alemã a grande maioria dos partidos socialistas oficiais são republicanos por condição. Nisto percebemos, entre mentalidades estreitas e pouco preparadas, a crença de que socialismo e monarquismo são elementos incompatíveis. Tal conceito funda uma confusão básica. Socialismo – ao menos em sua forma atual – é essencialmente um programa econômico-social. Nada tem a ver com forma de governo. O republicanismo desse partidos socialistas não emana de seus programas efetivos, mas satisfaz às crenças particulares de seus líderes. Isto é demonstrado pelo fato de que a maior parte da realmente poderosa Europa socialista não é republicana, mas monarquista. É este o caso na Grã-Bretanha, na Escandinávia e na Holanda. Em todos esses países encontramos não apenas excelentes relações entre a Coroa e os socialistas, como também a ninguém poderá escapar a impressão de que uma monarquia provê um melhor lastro para os partidos trabalhistas que uma república. Um dos grandes líderes do Partido Trabalhista Britânico explicou isto como a influência equilibrante e moderadora da Coroa, que dá condições aos socialistas de conduzir seu programa com mais vagar, mais prudência, e, a partir disso, com maior sucesso. Ao mesmo tempo, um dirigente erguido sobre os partidos representa uma satisfatória salvaguarda para a oposição, tal que não é necessário recorrer a meios extremos para recuperar poder. O partido pode aguardar mais calmamente os desenvolvimentos.
Seja isto verdade ou não, os fatos comprovam que não faz sentido desenhar uma linha divisória artificial entre monarquismo e socialismo, ou entre monarquismo e democracia clássica. O mesmo se aplica ao republicanismo. Outro ponto merece ser mencionado. Trata-se da frequente confusão, em particular em meio àqueles não versados em ciência política, entre monarquia como forma de governo e uma ou outra dinastia monárquica; em outras palavras, a confusão entre monarquismo e legitimismo.
Legitimismo, um laço especial com uma pessoa ou uma dinastia, é algo que sempre será custoso discutir em termos razoáveis e objetivos. É uma questão de sentimento subjetivo, e, portanto, advogado ou contestado por argumentos ad hominem. Uma discussão racional sobre problemas correntes deve, portanto, fazer clara distinção entre monarquismo e legitimismo dinástico. A forma de governo de um Estado é um problema político. Deve, por conseguinte, ser discutido independentemente de família ou pessoa que esteja ou estivesse à cabeceira do estado. Nas monarquias sempre houve mudanças dinásticas. Por princípio, a instituição tem maior importância que seu representante; este último é mortal, ao passo que a anterior, em termos históricos, é imortal.
Observar uma forma de governo meramente com o olhar voltado ao seu representante leva a resultados grotescos. Neste caso, as repúblicas teriam de ser julgadas em bases não políticas, mas de acordo com as características de seus presidentes. Isto seria, evidentemente, o cúmulo da irretidão.
Vale acrescentar que entre os protagonistas do monarquismo na Europa republicana há relativamente poucos legitimistas. O Rei Afonso XIII da Espanha citou, certa vez, que o legitimismo não sobreviveria uma geração. Isto é importante onde há uma tradicional forma de governo fortemente estabelecida, com a qual a maioria dos cidadãos se sentem satisfeitos. Mas esta espécie de legitimismo pode fundamentar-se tão bem em repúblicas quanto em monarquias. Alguém pode falar de legitimismo republicano na Suíça e nos Estados Unidos, tal como outro pode falar em legitimismo monárquico na Grã-Bretanha e na Holanda. Em mais países da Europa, tem havido, sem dúvida, muitas mudanças profundas no curso de séculos em que o legitimismo ocorreu em menor frequência. Em tais condições, é particularmente perigoso recorrer a argumentos emocionais.
Estamos agora numa posição de definir o que entendemos a cerca de monarquia e república. Monarquia é aquela forma de governo na qual o cabeça do Estado não é eleito, que funda seu cargo numa lei mais alta, associada ao princípio de que todo poder origina-se de uma fonte transcendental. Numa república, o mais alto cargo estatal é eletivo, pelo que sua autoridade deriva de seus eleitores, isto é, de um grupo particular que o elegeu.
Deixando de lado considerações puramente emocionais, há bons argumentos para essas duas formas básicas de governo. Os mais importantes argumentos em favor do republicanismo podem resumir-se nos seguintes: Em primeiro lugar, as repúblicas são, com poucas exceções, seculares. Elas não requerem apelo divino algum para justificar sua autoridade. Sua soberania, a fonte de sua autoridade, deriva do povo. Em nosso tempo, em que se rejeita cada vez mais os conceitos religiosos, ou, no mínimo, se os lega ao domínio da metafísica, conceitos constitucionais seculares e uma forma de governo secular são mais facilmente aceitáveis que uma forma enraizada, em última estância, em ideias teocráticas. É, por conseguinte, também mais fácil para uma república adotar uma versão secular dos Direitos Humanos. A vantagem que tal forma de governo oferece apareceria, portanto, como o fato de estar em sintonia com o espírito do nosso tempo, e, por extensão, com a grande massa populacional.
Em acréscimo, a escolha do cabeça de Estado não depende de um nascimento ancestral, mas da vontade do povo ou de uma elite. O término do cargo presidencial é marcado. O presidente pode ser removido, e se ele é incapaz, é fácil substituí-lo. Ele próprio é um cidadão comum, ele está em sintonia com a vida real. E é de se esperar que, com uma educação melhor, as massas tornar-se-ão, gradualmente, mais capazes da escolha do homem certo. Numa monarquia, por outro lado, uma vez que um mau chefe tenha ascendido ao trono, é quase impossível removê-lo sem derrubar completamente o regime. E ultimamente tem sido argumentado que qualquer cidadão pode, ao menos teoricamente, tornar-se presidente, o que estimula um senso de responsabilidade política e ajuda a população a alcançar maturidade política. O caráter patriarcal de uma monarquia, por outro lado, leva os cidadãos a apoiarem-se em seu chefe, e a passar toda a responsabilidade política às suas costas.
Em favor do monarquismo, os seguintes argumentos podem ser colocados: A experiência demonstra que reis geralmente conduzem melhor, e não pior, que presidentes. Há uma razão prática para isto. Um rei nasce em seu cargo. Ele cresce nele. Ele é, na mais precisa acepção da palavra, um “profissional”, um expert no campo do ofício estatal. Através de sua vida, o expert plenamente qualificado é mais arrazoado que o amador, ainda que brilhante. Particularmente, em caso de dificuldade, assunto extremamente técnico – e o que é mais difícil que um Estado moderno? – conhecimento e experiência têm mais peso que o puro brilhantismo. Existe, certamente, o perigo de um incompetente suceder ao trono. Porém não foi um Hitler escolhido como líder, e um um Warren Harding eleito presidente? Nas monarquias clássicas da Idade Média, era ao menos possível substituir um sucessor ao trono obviamente incapaz por um mais adequado. Só com decadência do monarquismo, na fase do despotismo da corte de Versailles, é que esse recurso corretivo foi descartado. Nada seria mais apropriado a uma monarquia moderna que a instituição de um tribunal judicial que possa, se necessário, intervir para alterar a ordem de sucessão ao trono.
Mais importantes que as qualificações “profissionais” do rei é o fato de que ele não está atado a nenhum partido. Ele não deve sua posição a um corpo de eleitores ou ao suporte de interesses poderosos. Um presidente, por outro lado, é sempre devedor de alguém. Eleições são dispendiosas e difíceis de concorrer. O poder do dinheiro e as grandes organizações de massa geralmente se fazem sentir. Sem sua ajuda, é quase impossível alguém tornar-se cabeça de Estado de uma república. Tal suporte não é, de modo algum, concedido a troco de nada. O cabeça de Estado permanece dependente daqueles que o ajudaram na ascensão ao comando. Por consequência, o presidente não é mais o presidente de um povo todo, mas apenas daqueles grupos que o ajudaram a alcançar o cargo. Desse modo, partidos políticos ou grupos de interesse econômico podem controlar as mais altas patentes do Estado, que não mais pertencem à totalidade da população, mas, temporária ou permanentemente, ao domínio privilegiado de um ou outro grupo de cidadãos. Existe, então, o perigo de uma república deixar de ser a guardiã dos direitos de todos os seus cidadãos. Isto – costuma-se frisar entre monarquistas – é particularmente perigoso em nosso tempo. Hoje os direitos de grupos individuais e minoritários corre perigo maior que em todas as épocas precedentes. Concentrações de poder financeiro e amplas e poderosas organizações são em geral ameaças ao “homem pequeno”. Particularmente numa democracia, ele tem grande dificuldade de obter atenção, uma vez que o setor populacional do qual faz parte não tem como organizar-se facilmente, e não tem grande importância econômica. Se o mais alto pináculo do Estado é manipulado em prol de partidos políticos, o desfavorecido não terá a quem recorrer por ajuda. Um dirigente monárquico, ou, por outra – o assim denominado – é independente, e votado imparcialmente a todos os cidadãos. Suas mãos não estão atadas ante algum poder; ele pode proteger os direitos do menos favorecido. Especialmente numa época de profundas transformações econômicas e sociais, esta é a maior importância que o cabeça de Estado precisa estabelecer acima dos partidos . . .
E, concluindo, a Coroa proporciona à vida política a estabilidade, sem a qual não se pode resolver grandes problemas. Numa república a firmeza dos alicerces é falha. Quem quer que esteja no poder tem de alcançar um sucesso positivo no mais curto espaço de tempo, sem o que não será re-eleito. Isto leva a políticas de alcance limitado, que não serão capazes de fazer frente a problemas de abrangência histórica mundial.
Há mais um ponto a considerarmos, antes que possamos responder a questão de qual forma de governo melhor servirá à comunidade no futuro. Falando em termos gerais, repúblicas democráticas representam um regime dominado pela legislação, ao passo que regimes autoritários são dominados pelo executivo. Há muito tempo que o poder judiciário não retém a primazia, como temos constatado. Ele funda sua expressão original nas monarquias Cristãs. É frequentemente esquecido o fato de que o dirigente honesto tem sido sempre o guardião da lei e da justiça. Os mais antigos monarcas – os reis da Bíblia – originaram-se das fileiras dos juizes. São Luiz de França observou a administração da justiça como sua mais nobre tarefa. O mesmo princípio pode ser visto nos muitos “Palatinados” alemães, desde quando o Conde Palatino (Palatinus) foi o guardião da lei e da justiça delegado pelo Rei-Imperador. A história das grandes monarquias medievais mostra que o poder legislador do rei – mesmo de um rei tão poderoso quanto Carlos V – era rigorosamente limitado por autonomias locais. O mesmo vale para as funções executivas. Ele não era, em princípio, um ministrador de leis ou cabeça do executivo; ele era um juiz. Todas as outras funções eram subordinadas, e exercidas apenas na medida necessária para efetivar sua função judicial.
A razão para tal arranjo institucional é clara. O juiz tem de interpretar o significado da lei e da justiça, e para fazê-lo, tem de ser independente. É essencial que ele não deva sua posição e função a homem algum. O supremo juiz, enfim, tem de estar em sua posição. Isto só é possível numa monarquia. Numa república, até o mais alto guardião da lei recebe sua posição de alguma outra fonte, pela qual é responsável ou da qual permanece, em certo grau, dependente. Este não é um estado de coisas satisfatório. Seu mais importante encargo não é adjudicar em disputas legais ocorrentes, mas manter a guarda sobre o propósito do Estado e da lei natural. Acima de tudo, a função do juiz supremo é cuidar para que toda a legislação esteja de acordo com os princípios fundamentais do Estado, isto é, com a lei natural. O direito monárquico de vetar a legislação, tramitando no parlamento, é uma reminiscência dessa função antiga…
A futura forma de Estado será algo totalmente novo, algo que representará princípios de validade eterna, na forma apropriada ao futuro, sem os erros do passado…
O caráter hereditário da função monárquica não encontra sua justificação apenas pela educação “profissional” do herdeiro do trono. Também não se trata somente de uma questão de continuidade no cume da hierarquia política, embora tal continuidade seja altamente desejável, em se tratando de uma questão de planejamento para gerações futuras. Sua mais fundamental justificação baseia-se no fato de que o dirigente hereditário deve sua posição não a um ou outro grupo social, mas somente à vontade de Deus. Tal é o verdadeiro significado da frequentemente mal compreendida expressão “pela graça de Deus”, que sempre significa um dever e uma missão. Seria um erro para o dirigente por graça de Deus olhar a si próprio como um ser excepcional. Pelo contrário, as palavras “Pela graça de Deus” devem lembrá-lo de que ele não deve sua posição a seus próprios méritos, mas que precisa provar sua competência por incansáveis esforços em prol da justiça.
Assim como há muito a dizer sobre a transmissão hereditária da suprema posição do Estado, há também um sério inconveniente, já mencionado. Se a sucessão ocorre automaticamente, existe a possibilidade de ser o trono ocupado por um incompetente. Este é o grande perigo do sistema monárquico. Por outro lado, este perigo data apenas do período em que se estabeleceu o legitimismo inflexível de Versailles, e as salvaguardas existentes, de um ou de outro modo, nas monarquias mais clássicas desapareceram. Tais salvaguardas deveriam, portanto, ser instituídas nas futuras constituições monárquicas. Seria um erro legar tal função a corpos políticos, o que equivaleria a abrir a porta aos interesses privados. A decisão deve ser legada a um tribunal judicial. O rei, como o mais alto juiz constitucional do Estado, não pode exercer sua função num vácuo. Ele terá de ser assistido por um corpo representativo da autoridade judicial suprema, do qual ele constitui a cabeça. É tal corpo que determinaria se uma lei ou um regulamento é constitucional, ou seja, compatível com o propósito do Estado. Quando morre o dirigente, outro juiz continuará em função. O dever desse corpo seria confirmar a adequação de herdeiro presuntivo, e, se necessário, substituí-lo pelo próximo na linha sucessória.
A atividade do cabeça de Estado será, com certeza, transportada ao campo exclusivamente judicial. Ele terá de controlar o executivo, pois seu dever é cuidar para que as decisões do poder judiciário sejam postas em prática. Não obstante, todas essas tarefas ficarão em plano secundário. É em sua junção judicial que um monarca do Século 20 encontrará sua principal justificação.

Lula foi mais caro que os reis da Europa



LULA FOI MAIS CARO QUE OS REIS DA EUROPA

Daniel Aguiar*

Recentemente o país ficou chocado com os altos gastos de membros do Governo Federal, efetivados com o chamado “cartão corporativo”. A edição nº 1997 da revista IstoÉ chegou a falar em R$ 5,8 milhões, sacados na boca do caixa entre 01 de janeiro de 2003 e 31 de janeiro de 2008 – um período de cinco anos, portanto – para atender às despesas do Presidente, da Primeira Dama e de suas equipes.

Infelizmente, estes valores são só a ponta do iceberg. Isso não chega a fazer nem cócegas no real montante que custa a República brasileira.

Segundo dados do sítio Contas Abertas, obtidos diretamente do Siafi (Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal), no ano de 2006, o custo da Presidência e da Vice-Presidência do Brasil foi de R$ 288.656.937,79 (isso mesmo: duzentos e oitenta e oito milhões, seiscentos e cinqüenta e seis mil, novecentos e trinta e sete reais e setenta e nove centavos). Em dólares: US$ 165.012.826,00. Espere ainda um pouquinho antes de se comover, caro leitor: esses dados vão somente até o dia 05 de setembro daquele ano!

Agora, a parte interessante: no mesmo ano de 2006, a Coroa Britânica custou ao povo do Reino Unido US$ 73.357.482,00; a Coroa Dinamarquesa, US$ 15.650.879,00; já a Coroa Sueca, US$ 23.298.425,00. Somadas, as três gastaram, no mesmíssimo ano de 2006, o montante de US$ 112.306.786,00 – ou seja, JUNTAS, as três monarquias européias citadas gastaram em um ano inteiro quase 32% A MENOS do que o Governo brasileiro gastou em 8 meses e 5 dias... agora sim, dá pra ficar comovido.

Já que estamos falando de estatísticas, permitam-me só mais uma: a monarquia britânica, considerada a mais cara de todas, custa por volta de US$ 1,21 per capita ao contribuinte. A Presidência e a Vice-Presidência do Brasil conseguem a notável façanha de extrapolar esse valor, cravando cerca de US$ 1,34 per capita. Detalhe: enquanto o Reino Unido tem apenas 60,6 milhões de habitantes, o gigante Brasil já tem quase 184 milhões de almas, o que significa três vezes mais gente pagando uma das maiores cargas tributárias do mundo para sustentar essa corte republicana. (Depois me vêm certos partidos que têm o grave vício de confundir “valores republicanos” com “valores democráticos”).

Aí fica a pergunta: o quê afinal de contas é esse negócio de “democracia” que todo dia a gente ouve falar, muitas vezes com a língua presa, dizendo “democrafia”? Será que democracia é só obrigar um povo em grande parte semi ou totalmente analfabeto a depositar um voto numa urna, quando esse povo nem faz idéia de como diferenciar estadistas de demagogos? O povo preferia ficar em casa aproveitando o domingo, pode apostar.

E já que, com os 200 anos da chegada de Dom João VI, virou moda falar de reis novamente, veja essa: até a monarquia brasileira, aquela que a gente estuda muito superficialmente na escola, conseguia dar lição de moral nos nossos atuais governantes. Alguns dados interessantes (desculpem, não consigo evitar): Dom Pedro II recebia um salário de 67 contos de réis, e com a maior parte disso ele fazia obras de caridade. Deposto o Imperador e proclamada a ré pública, desculpem, a República, qual foi uma das primeiras providências do Marechal Deodoro da Fonseca? Instituir para si um salário presidencial de 120 contos. Já sei onde de fato começou a comilança.

Decerto por estar “profundamente condoído” com o degredo de Pedro II e toda a sua família (eles foram expulsos do Brasil à noite, pois se fosse de dia sabia-se que o povo não os deixaria partir), o mesmo Marechal-presidente teve a idéia de oferecer ao Imperador traído um bônus de 5.000 contos, uma espécie de “toma tua parte e estamos quites”, a título de custeio da instalação da Família Imperial no exílio. O último monarca do Brasil, Pedro II, que não tinha dívidas de campanha, não precisava comprar apoio para formar sua base no Parlamento, não precisava pagar a tapioca comprada com cartão corporativo e tinha uma sublime combinação de amor pelo Brasil com vergonha na cara, replicou: “Quem são vocês para dispor livremente do dinheiro do meu País”? E recusou a mamata. Morreu pobre, velho e doente, desgostoso, porém honrado até o fim, num hotelzinho de Paris. Para o túmulo, uma das únicas coisas que ele quis levar foi um travesseirinho recheado de terra brasileira – literalmente.

É, caro leitor, deve ser por tudo isso que Aristide Briand dizia: “Portugal é um país pobre demais para poder sustentar uma república”. Ou talvez também tenham sido essas as razões pelas quais Charles de Gaulle declarou: “O Brasil não é um país sério”.

Mas é certeza histórica que esse foi o motivo pelo qual a dona do 2º IDH e da 2ª renda per capita mais altos do mundo, a Noruega, ao se tornar independente da Suécia em 1905, preferiu instaurar uma monarquia: É MAIS BARATO.

Agora, fala sério: depois dessa, quem é que consegue achar absurdo o gasto com cartões corporativos do Governo? Absurdos somos nós que engolimos tudo isso. God save the Queen...



*Daniel Aguiar Novais é presidente do Círculo Monárquico de Montes Claros.





Quadro: MORDOMIA DE PRESIDENTE VALE MAIS:

País
Período
Gastos (US$)
Reino Unido
2006/7
£37.400.000,00 = US$ 73.357.482,00
(US$ 1,21 per capita no ano)
Dinamarca
2006
DKK 79.481.425,00 = US$ 15.650.879,00
Suécia
2006
SEK 147.500.000,00 = US$ 23.298.425,00
Os 3 acima somados
Idem
US$ 112.306.786,00

BRASIL

(Presidência e Vice-Presidência)
2002
R$ 140.716.508,29
2003
R$ 226.955.092,06
2004
R$ 356.842.968,55
2005
R$ 361.969.140,22
2006 (até 05/Set)
R$ 288.656.937,00 = US$ 165.012.826,00
(US$ 1,34 per capita no ano)

Fontes:

- www.contasabertas.uol.com.br (com dados do Siafi)

Por que não se cala?



Por que não se cala?

Ezequiel Novais Neto *

No dia 12 de novembro de 2007 um fato inusitado sacudiu a imprensa internacional. Na 17ª Cúpula Ibero-americana, o tiranete venezuelano, Hugo Chávez, começou a lançar acusações contra o ex-primeiro ministro espanhol José María Aznar, chamando-o, entre outras coisas, de fascista. Da maneira polida que compete aos líderes de países civilizados, o atual chefe de governo espanhol, José Luis Rodríguez Zapatero, que, diga-se de passagem, é adversário político de Aznar, esperou o bolivariano terminar de lançar seus impropérios e tomou a palavra. Repreendeu educadamente o mandatário venezuelano, lembrando-o que o acusado em questão, ausente no encontro, fora representante escolhido democraticamente pelo povo espanhol e que seu governo fora legítimo e, como tal, deveria ser respeitado. Contudo, nem todos os chefes de nações primam pela polidez e Chávez continuava a soltar sua enxurrada palavrosa quando aconteceu... O Rei Juan Carlos, o Chefe de Estado Espanhol, abriu mão de sua tradicional fleuma e falou em alto e bom tom ao presidente da Venezuela o que meio mundo queria falar há muito tempo: “Por qué no te callas?” (por que não se cala?). Em seguida, abandonou o local.

O suposto revolucionário teve de dormir com essa. Contudo, logo em seguida começou a atacar a figura do Rei, dizendo-se mais legítimo que o Monarca (será?) por ter sido eleito por três vezes. Há aqui uma deturpação assustadora de lógica elementar. Ele pode criticar a seu bel-prazer um ex-líder, cujo mandato foi democrático e nem estava presente para se defender. Porém, quando lhe chamam a atenção diretamente, ele corre a exigir um pedido formal de desculpas. Há um certo desequilíbrio aqui. As colocações do primeiro-ministro e do Rei foram no sentido de exigir o devido respeito com o representante legítimo do povo espanhol em um dado momento. E aqui no Brasil? Que vemos? Nosso presidente resolve se pronunciar, dizendo que se houve um erro foi a presença do Monarca espanhol, que ele não é um de nós (mas o encontro não era Ibero-americano?) e que a Venezuela é um lugar muito democrático, pois lá houve muitos plebiscitos e discussões. Nosso presidente, que nunca sabe de nada, deveria se lembrar de que a Democracia não se restringe ao voto, embora este seja parte inseparável daquela. Democracia Real, para existir, exige também a livre manifestação das diferentes correntes de pensamento e uma efetiva independência entre os poderes instituídos, quesitos que Venezuela não preenche de forma nenhuma. As colocações de nosso presidente, simpáticas ao tiranete, não apenas mostram que ele comunga os ideais de Chavez e tem certa, digamos, submissão a ele, mas também alimentam o temor de que um dia ele possa resolver fazer o mesmo por aqui...

No Brasil, já tivemos um representante com essa coragem. Refiro-me a Dom Pedro II na Questão Christie. Em 1862, marinheiros ingleses, bêbados e em trajes civis, provocaram tumultos na Capital do Império. Foram então presos e, confirmada sua condição de militares, liberados. O inábil e prepotente embaixador britânico William D. Christie exigiu um pedido formal de desculpas e indenização dos valores contidos em um navio que fora supostamente naufragado por brasileiros (O Prince of Wales). No ano seguinte, o almirante Warren promoveu o apresamento de cinco navios mercantes brasileiros. Diante do inimigo muito mais forte militarmente, o Governo Imperial pagou, sob protesto, o valor exigido. Contudo, Dom Pedro II solicitou o arbitramento internacional do Rei da Bélgica para a questão dos marinheiros arruaceiros, exigiu uma indenização pelos navios apresados e um pedido formal de desculpas pela invasão do litoral brasileiro. Face à resposta negativa de Londres, cortou relações diplomáticas com a Inglaterra em 1863. Nesse mesmo ano saiu o parecer favorável à posição brasileira. Somente quando o Reino Unido enviou um pedido formal de desculpas ao Imperador, em 1865 e após o início da Guerra do Paraguai, é que foram restabelecidas as ligações de diplomacia entre as nações. O ato de Dom Pedro II seria o equivalente a nosso presidente cortar relações com os Estados Unidos hoje. Desde a proclamação da república não se vê semelhante ato de altivez frente ao estrangeiro. Parece que isso é coisa de Monarcas. Fica a lição para nosso presidente. O mesmo Dom Pedro II permitia a liberdade total de expressão, inclusive contra ele mesmo e a Monarquia, no período de maior liberdade de imprensa jamais vista no Brasil republicano. Fica o exemplo para o ditador bolivariano.

Hoje, quando vejo a passividade de nosso (des)governo face aos abusos de outras nações contra os interesses brasileiros, fico desejando que tivéssemos um Juan Carlos ou um Pedro II à frente de nosso Estado. E quando olho para o Palácio do Planalto e para Caracas eu pergunto: por que não se calam?


*Médico Endocrinologista e vice-presidente do Círculo Monárquico de Montes Claros (CMMOC)

A Farsa de Sinhá Moça


A FARSA DE SINHÁ MOÇA

Ezequiel Novais Neto


Não tenho o hábito de assistir novelas. Contudo, em noite recente fiquei pasmado ao acompanhar um capítulo de um romance “de época” – Sinhá Moça - apresentado pela maior emissora de televisão do País. De um lado, todos os abolicionistas eram republicanos. Do outro, todos os escravagistas eram monarquistas. Pude depois constatar, ao fazer questão de assistir nos dias seguintes outras partes da série, que essa farsa histórica não era evento isolado, mas quase uma filosofia embutida em todo o seu texto. Fiquei a pensar no quanto nossa mídia em geral, mais particularmente e extensamente a televisiva, longe de contribuir para o esclarecimento da população, tem-se mostrado eficientíssima na arte do desaculturamento e fixação de preconceitos.

Forçoso é que se estude como foi o verdadeiro andamento desses dois movimentos, que nada tiveram a ver um com o outro. O movimento republicano passa a existir oficialmente no país quando, inspirados então pela proclamação da Terceira República francesa, políticos paulistas decidiram elaborar um Manifesto Republicano em 1870 e, em 1873, formalizar a criação de um partido. Sempre muito pouco representativos
(mesmo imediatamente antes de 15 de novembro de 1889, quando por um golpe de Estado proclamaram a república, eles jamais conseguiram eleger mais de três deputados!) notaram que dificilmente a monarquia seria destituída sem o socorro das armas do Exército. Assim a imprensa republicana passou a vigiar cada manifestação dos oficiais bem como colocou suas páginas ao seu serviço para que dessem vazão à sua insatisfação. Inclusive ao tempo da proclamação, os republicanos eram ínfima minoria nos setores civis da nação, rodeados de monarquistas por todos os lados.

Por outro lado, a verdade é que o que caracterizava essas sedições era, além da quimera republicana, o separatismo: os movimentos nordestinos almejavam secessão do restante do País. A República Farroupilha foi outra rebelião claramente separatista. Há que se lembrar que tais movimentos, na América Latina, haviam levado ao caudilhismo. Esse fator conduzia à desagregação tão característica das antigas colônias espanholas matando, inclusive, os sonhos de união de seus idealizadores, como O’Higgins, Sucre, San Martín ou Simon Bolívar. Ou seja, o Império garantira, até então, a unidade da Nação, ao passo que o republicanismo, tanto em seus sucessos nos países vizinhos como em suas primeiras tentativas no Brasil, levava à fragmentação política.

Há que se considerar que o sucesso final da implantação da república no Brasil se deveu, em grande parte, à adesão dos cafeicultores paulistas escravocratas, ressentidos com o Império devido à Abolição da escravatura, sem uma contrapartida de indenização por estes reclamada. Em mais de uma ocasião, em vários jornais da época, eles se manifestavam contra a Abolição. Esse último fato, por si só, deveria bastar para desmistificar a associação entre republicanismo e abolicionismo. Não que não tenham existido abolicionistas republicanos: Temos o caso do poeta abolicionista e republicano Luís Gama. Contudo, em geral, o abolicionismo foi um movimento muito anterior ao republicanismo, que tinha fortes apoiadores dentro da Monarquia e da
própria Família Imperial Brasileira. Em resumo: o republicanismo teve sua maior expressão em um período após o surgimento do abolicionismo. Não foi resultado de aspiração das massas, e sim de uma minoria e, pior, alçou o poder após a adesão daqueles que até bem pouco tempo antes eram totalmente contrários à Abolição!

Não se pode esquecer que a Lei Eusébio de Queiroz data de 1850 e já era a proibição do contrabando de escravos para o Brasil. O Imperador D. Pedro II foi decisivo em sua fala à Olinda, que culminou com a Lei Rio Branco (Lei do Ventre Livre), de 1871. Já nesse momento estava determinado o fim da Escravidão, a princípio por uma lei moderada, mas que já deixava claro que “a escravidão é uma causa perdida, ferida de
morte desde 1871, e o Governo apenas trata de dar-lhe morte lenta”. Isso em um período em que a causa abolicionista ainda tinha poderosos interesses contra ela. Logo a seguir vem a Lei dos Sexagenários, que contribuiria mais para a redução da população escrava no país. Como corolário, vem a Lei Áurea, que pôs fim definitivo à escravidão. Todos esses eventos ocorreram no Império, através de leis assinadas por membros da Família Imperial. Que mais dizer? Citar os nomes de Joaquim Nabuco, o pai do Abolicionismo e monarquista; ou o de André Rebouças, negro, engenheiro (com os estudos pagos por D. Pedro II), abolicionista e também monarquista? Será preciso citar a carta em que a Princesa Isabel descreve seu projeto de assentamento dos negros recém-libertos, uma verdadeira reforma agrária? Que esse projeto foi arquivado com a proclamação da república?

E os principais interessados, os negros, como viam as coisas? A Princesa Isabel passa a ser conhecida como “A Redentora”. A Abolição era associada à Monarquia, que ficara mais popular que nunca. Muitos negros passaram inclusive a integrar a “Guarda Negra”, da qual o então republicano Ruy Barbosa dizia ser composta pela “ralé carioca e por maltas de capoeiras”, que hostilizava francamente os republicanos. Essa Guarda acreditava ser seu dever proteger das violências republicanas o sistema que os libertara. Digo claramente: os ex-escravos guardavam lealdade à Monarquia e se opunham aos republicanos, conhecidos, então, como “os paulistas”. O já citado André Rebouças com a proclamação preferiu se exilar junto com a Família Imperial, dizendo saber que, para ele, não havia mais lugar no País...

Hoje, 117 anos depois, vejo inclusive através de novelas transmitidas pela televisão, uma falsa associação da Monarquia à escravidão. No Plebiscito de 1993 disseram que a Monarquia traria de volta o escravismo. As novelas, séries e filmes, com seus “programas de época”, ensinam que o republicanismo e o abolicionismo andavam de mãos dadas, uma mentira histórica. Tristemente, constato que perdemos nossa memória, e a mídia brasileira, particularmente a televisiva, faz questão de que assim continue. Quantos de nossos irmãos, inclusive negros, caíram na farsa de Sinhá Moça?

A Luz do Baile



D. PEDRO II
Monteiro Lobato
Desapercebidos de todo passaram-se este mês dois aniversários. A 2 de dezembro nasceu, a 5 de dezembro faleceu D. Pedro II. Quem foi este homem que não deixou lembranças neste país? Apenas um imperador... Um imperador que reinou apenas durante 58 anos... Tirano? Despótico? Equiparável a qualquer facínora coroado? Não. Apenas a Marco Aurélio.
A velha dinastia bragantina alcançou com ele esse apogeu de valor mental e moral que já brilhou em Roma, na família Antonina, com o advento de Marco Aurélio. Só lá, nesse período feliz da vida romana, é que se nos depara o sósia moral de Pedro II.
A sua função no formar da nacionalidade brasileira não está bem estudada. Era um ponto fixo, era uma coisa séria, um corpo como os há na natureza, dotado de força catalítica.
Agia pela presença.
O fato de existir na cúspide da sociedade um símbolo vivo e ativo da Honestidade, do Equilíbrio, da Moderação, da Honra e do Dever, bastava para inocular no país em formação o vírus das melhores virtudes cívicas.
O juiz era honesto, se não por injunções da própria consciência, pela presença da Honestidade no trono. O político visava o bem publico, se não por determinismo de virtudes pessoais, pela influência catalítica da virtude imperial. As minorias espiravam, a oposição possibilizava-se: o chefe permanente das oposições estava no trono. A justiça era um fato: havia no trono um juiz supremo e incorruptível. O peculatário, o  defraudador, o político negocista, o juiz venal, o soldado covarde, o funcionário relapso, o mau cidadão enfim, e mau por força de pendores congeniais, passava, muitas vezes, a vida inteira sem incidir num só deslize. A natureza o propelia ao crime, ao abuso, à extorsão, à violência, à iniqüidade – mas sofreava as rédeas aos maus instintos a simples presença da Equidade e da Justiça no trono.
Ignorávamos isso na monarquia.
Foi preciso que viesse a república, e que alijasse do trono a Força Catalítica para patentear-se bem claro o curioso fenômeno.
A mesma gente, o mesmo juiz, o mesmo político, o mesmo soldado, o mesmo funcionário até 15 de novembro honesto, bem intencionado, bravo e cumpridor dos deveres, percebendo, na ausência do imperial freio, ordem de soltura, desaçamaram a alcatéia dos maus instintos mantidos em quarentena. Daí, o contraste dia a dia mais frisante entre a vida nacional sob Pedro II e a vida nacional sob qualquer das boas intenções quadrienais que se revezam na curul republicana.
Pedro II era a luz do baile.
Muita harmonia, respeito às damas, polidez de maneiras, jóias d’arte sobre os consolos, dando o conjunto uma impressão genérica de apuradíssima cultura social.
Extingue-se a luz. As senhoras sentem-se logo apalpadas, trocam-se tabefes, ouvem-se palavreados de tarimba, desaparecem as jóias...
Como, se era a mesma gente!
Sim, era a mesma gente. Mas gente em formação, com virtudes cívicas e morais em início de cristalização.
Mais um século de luz acesa, mais um século de catálise imperial, e o processo cristalizatório se operaria completo. O animal, domesticado de vez, dispensaria açamo. Consolidar-se-iam os costumes, enfibrar-se-ia o caráter. E do mau material humano com o que nos formamos sairia, pela criação duma segunda natureza, um povo capaz de ombrear-se com os mais apurados em cultura.
Para esta obra moderadora, organizadora, cristalizadora, ninguém mais capaz do que Pedro II; nenhuma forma de governo melhor do que sua monarquia.
Mas sobrevém, inopinada, a república.
Idealistas ininteligentes, emparceirados com a traição e a inconsciência da força bruta, substabelecem-se numa procuração falsa e destroem a obra de Pedro II "em nome da nação".
A nação não reage, inibida pela surpresa e também porque lhe acenam logo com um programa de maravilhas, espécie de paraíso na terra.
É sempre assim. Não variam com longitude nem com a latitude os processos psicológicos de assalto ao poder.
Aqui, assaltado o poder e conquistadas as posições, houve um geral arrancar de máscaras:
Enfim, sós!
O "Alagoas" levava a bordo a luz importuna, a luz que empatava. E começou a revista de ano que há trinta anos diverte o país.
Que diverte, mas que envenena.
Que envenena e arruína.
O que havia de cristalização social dissolve-se, volta ao estado de geléia.
Sucedem-se na cena os atores, gingam-se as mesmas atitudes, murmuram-se as mesmas mensagens, reeditam-se eternas promessas.
O povo, cansado e descrente, farto de uma palhaceira destituída da mínima originalidade, cochila nas arquibancadas. Nem aplaude, nem assobia - dorme e sonha, entre outras coisas, com o inopinado surto em cena de um delegado de polícia loiro e dez praças de uniforme desconhecido que ponham fim à pantomima.
Não intervém para realizar por mãos próprias o "basta", porque se sente tão gelatinoso como os atores. Nada o galvaniza, não o espanta
nenhum jangotismo de tony. Abudistado, assiste até o indecoroso matar-se em massa.
As cenas do ano 1900 desenroladas na capital da república, durante a última epidemia, são "os nove fora nada" da obra do 15 de novembro. A máquina governamental, caríssima, não funciona nos momentos de crise. Não é feita para funcionar, se não para sugar com fúria acarina o corpo doente do animal empolgado.
De Norte a Sul o povo lamuria a sua desgraça e chora envergonhado o que perdeu.
Tinha um rei. Tem sátrapas.
Tinha dinheiro. Tem dívidas.
Tinha justiça. Tem cambalachos de toga.
Tinha Parlamento. Tem ante-salas de fâmulos.
Tinha o respeito do estrangeiro. Tem irrisão e desprezo.
Tinha moralidade. Tem o impudor deslavado.
Tinha soberania. Tem cônsules estrangeiros assessorando ministros.
Tinha estadistas. Tem pêgas.
Tinha vontade. Tem medo.
Tinha leis. Tem estado de sítio.
Tinha liberdade de imprensa. Tem censura.
Tinha brio. Tem fome.
Tinha Pedro II. Tem ... Não tem!
Era. Não é.
Numa época terrível para a vida universal, em que cada país procura chefiar-se por intermédio dos homens de suprema energia - Wilson, Lloyd George, Clemenceau, Ebert -, o Brasil apalpa o pescoço e não sente a cabeça. Chegou à maravilha teratológica duma acefalia inédita.
Anos atrás foi apresentado à Câmara dos Deputados um projeto de lei mandando trasladar os restos de Pedro II para a terra natal. A consciência desse ramo do legislativo, num assomo de revivescência, votou, em apoteose, a lei. Maurício de Lacerda definira, nesse dia, a política republicana, como feita de alcouces e corrilhos. A Câmara desmentiu-o por cinco votos. Mas o Senado confirmou-lhe o asserto, por quase unanimidade. Não convinha à turba de sarcorhamphus pacificamente acomodada em torno da presa a devorar – a Pátria – a trasladação dos restos mortais. Quem sabe, conservariam essas cinzas algo da misteriosa força que caracterizou em vida Pedro II? E viriam elas – agindo pela presença – perturbar a paz do festim? "Nada, não perturbemos nossa digestão" – pensou o Senado. E o projeto caiu.
O Brasil é uma nação a fazer. Ou refazer, já que destruíram os alicerces da primeira tentativa séria. Cortado o fio da evolução natural, baralhados os materiais, dispensados os operários honestos e hábeis, hipotecadas as suas rendas, a política de hoje vive de uma indústria
nova: aluguel da consciência. Cada empresa estrangeira aluga uma série. De uma, a mais poderosa de todas, é sabido que chegou à perfeição de fichar comercialmente o preço de homens públicos.
É a deliqüescência final, o esverdear...
Este estado de coisas é, entretanto, galvanizável. Bastaria repor na máquina a peça mestra que tudo coordena, - essa força catalítica sem a qual nenhum povo como o nosso, instável, em formação, produto dos mais díspares elementos étnicos, conseguiu jamais alcançar as etapas sucessivas da nacionalidade.
Um homem, uma continuidade de ação, um pulso – o bisneto de Marco Aurélio ou Rosas.
A força mansa que norteia o evoluir ou a força violenta que arrasa, desespera, e cria pela dor o instinto de defesa.
Tudo é preferível ao reino manhoso dos guzanos de boca dupla – uma que mente ao povo, outra que o rói até aos ossos.
Esperemos em Anhangá, o deus brasileiro. Peçamos-lhe, neste mês dos aniversários imperiais, que ressuscite, e reponha no seu lugar o espírito bom que neutralizava a influência dos espíritos maus.
É a nossa derradeira esperança, Anhangá...

[Texto publicado na "REVISTA DO BRASIL",  vol. IX, Ano III, nº 36, p. 387-391, São Paulo, dezembro de 1918]