sábado, 7 de setembro de 2013

Por que não se cala?



Por que não se cala?

Ezequiel Novais Neto *

No dia 12 de novembro de 2007 um fato inusitado sacudiu a imprensa internacional. Na 17ª Cúpula Ibero-americana, o tiranete venezuelano, Hugo Chávez, começou a lançar acusações contra o ex-primeiro ministro espanhol José María Aznar, chamando-o, entre outras coisas, de fascista. Da maneira polida que compete aos líderes de países civilizados, o atual chefe de governo espanhol, José Luis Rodríguez Zapatero, que, diga-se de passagem, é adversário político de Aznar, esperou o bolivariano terminar de lançar seus impropérios e tomou a palavra. Repreendeu educadamente o mandatário venezuelano, lembrando-o que o acusado em questão, ausente no encontro, fora representante escolhido democraticamente pelo povo espanhol e que seu governo fora legítimo e, como tal, deveria ser respeitado. Contudo, nem todos os chefes de nações primam pela polidez e Chávez continuava a soltar sua enxurrada palavrosa quando aconteceu... O Rei Juan Carlos, o Chefe de Estado Espanhol, abriu mão de sua tradicional fleuma e falou em alto e bom tom ao presidente da Venezuela o que meio mundo queria falar há muito tempo: “Por qué no te callas?” (por que não se cala?). Em seguida, abandonou o local.

O suposto revolucionário teve de dormir com essa. Contudo, logo em seguida começou a atacar a figura do Rei, dizendo-se mais legítimo que o Monarca (será?) por ter sido eleito por três vezes. Há aqui uma deturpação assustadora de lógica elementar. Ele pode criticar a seu bel-prazer um ex-líder, cujo mandato foi democrático e nem estava presente para se defender. Porém, quando lhe chamam a atenção diretamente, ele corre a exigir um pedido formal de desculpas. Há um certo desequilíbrio aqui. As colocações do primeiro-ministro e do Rei foram no sentido de exigir o devido respeito com o representante legítimo do povo espanhol em um dado momento. E aqui no Brasil? Que vemos? Nosso presidente resolve se pronunciar, dizendo que se houve um erro foi a presença do Monarca espanhol, que ele não é um de nós (mas o encontro não era Ibero-americano?) e que a Venezuela é um lugar muito democrático, pois lá houve muitos plebiscitos e discussões. Nosso presidente, que nunca sabe de nada, deveria se lembrar de que a Democracia não se restringe ao voto, embora este seja parte inseparável daquela. Democracia Real, para existir, exige também a livre manifestação das diferentes correntes de pensamento e uma efetiva independência entre os poderes instituídos, quesitos que Venezuela não preenche de forma nenhuma. As colocações de nosso presidente, simpáticas ao tiranete, não apenas mostram que ele comunga os ideais de Chavez e tem certa, digamos, submissão a ele, mas também alimentam o temor de que um dia ele possa resolver fazer o mesmo por aqui...

No Brasil, já tivemos um representante com essa coragem. Refiro-me a Dom Pedro II na Questão Christie. Em 1862, marinheiros ingleses, bêbados e em trajes civis, provocaram tumultos na Capital do Império. Foram então presos e, confirmada sua condição de militares, liberados. O inábil e prepotente embaixador britânico William D. Christie exigiu um pedido formal de desculpas e indenização dos valores contidos em um navio que fora supostamente naufragado por brasileiros (O Prince of Wales). No ano seguinte, o almirante Warren promoveu o apresamento de cinco navios mercantes brasileiros. Diante do inimigo muito mais forte militarmente, o Governo Imperial pagou, sob protesto, o valor exigido. Contudo, Dom Pedro II solicitou o arbitramento internacional do Rei da Bélgica para a questão dos marinheiros arruaceiros, exigiu uma indenização pelos navios apresados e um pedido formal de desculpas pela invasão do litoral brasileiro. Face à resposta negativa de Londres, cortou relações diplomáticas com a Inglaterra em 1863. Nesse mesmo ano saiu o parecer favorável à posição brasileira. Somente quando o Reino Unido enviou um pedido formal de desculpas ao Imperador, em 1865 e após o início da Guerra do Paraguai, é que foram restabelecidas as ligações de diplomacia entre as nações. O ato de Dom Pedro II seria o equivalente a nosso presidente cortar relações com os Estados Unidos hoje. Desde a proclamação da república não se vê semelhante ato de altivez frente ao estrangeiro. Parece que isso é coisa de Monarcas. Fica a lição para nosso presidente. O mesmo Dom Pedro II permitia a liberdade total de expressão, inclusive contra ele mesmo e a Monarquia, no período de maior liberdade de imprensa jamais vista no Brasil republicano. Fica o exemplo para o ditador bolivariano.

Hoje, quando vejo a passividade de nosso (des)governo face aos abusos de outras nações contra os interesses brasileiros, fico desejando que tivéssemos um Juan Carlos ou um Pedro II à frente de nosso Estado. E quando olho para o Palácio do Planalto e para Caracas eu pergunto: por que não se calam?


*Médico Endocrinologista e vice-presidente do Círculo Monárquico de Montes Claros (CMMOC)

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