No mês de maio o pessoal da Universidade George Mason realizou um evento chamado "Por que não existe um Milton Friedman hoje?".
Friedman foi um grande economista, um influente intelectual público e
um pragmático realizador de reformas. De fato não há ninguém hoje
ocupando essas três posições. Tyler Cowen disse que existe um novo
Milton Friedman bizarro, o Paul Krugman. Outros disseram que hoje
existem tantos bons economistas que não há mais uma grande voz
dissidente.
Acho
que deveríamos fazer a mesma pergunta com Joaquim Nabuco. Nabuco teve
influência pública, proeminência política e obteve sucesso na sua
principal causa, o fim da escravidão. Por que hoje não existem pessoas capazes de dizer no congresso o que em 1879 Nabuco dizia no parlamento?
Se retirarmos o governo do caminho de todos, em vez de fazermos tudo depender do governo; se volvermos ao espírito de associação, em vez de matá-lo, sendo o Estado o primeiro concorrente a monopolizar todos os serviços; se dermos garantias à liberdade de consciência... [se afrouxarmos] os laços de centralização administrativa, que nos prendem, que nos entorpecem, creio que teremos feito alguma coisa.
Nabuco
não apenas estava em geral do lado certo, mas combatia seus oponentes
com uma retórica de fazer tremer os ossos. Ainda em 1879, durante um
debate sobre a reforma constitucional que pretendia diminuir o direito
ao voto, Nabuco convidava seus colegas de partido a empunharem a
"bandeira liberal":
A
bandeira liberal, senhores, tem tido na história grandes
transformações, encontrado imensas dificuldades, mas ela é ainda a mesma
bandeira que Péricles arvorou no Pnyx, a mesma que os Gracos levantaram
no Fórum; é a bandeira da “Reforma”, é a bandeira do Edito de Nantes, É
a bandeira dos Direitos do Homem. Em um país que luta pela sua
independência, É a bandeira da nacionalidade; em um país que já chegou a
grande desenvolvimento, é a bandeira das liberdades políticas; mas em
toda parte, ela é a mesma, em toda parte, de todos os lados, saúdam-na
todos os corações liberais, quer ela cubra o berço dos povos que nascem,
como a Itália, quer o túmulo dos povos que sucumbem, como a Polônia; é a
bandeira, senhores, da emancipação dos servos na Rússia, assim como é a
bandeira de Washington, defronte dos muros de Richmond. Em nosso país
foi a bandeira da inconfidência, a bandeira de 1817, a bandeira do
Ipiranga, a bandeira do Ato Adicional, até que hoje vem a ser de novo a
bandeira da Constituição. Nós a temos visto por algumas vezes triunfar,
temo-la visto mesmo, mutilada, mas ainda gloriosa, por entre o fumo que a
cerca, além das trincheiras que a detêm, galgar as alturas do poder
defendidas pelos nossos adversários, como quando Eusébio varreu o
tráfico da face dos mares, e Rio Branco decretou a emancipação dos
escravos!
Hoje a gente comemora quando um deputado consegue usar o plural direitinho.
Talvez
a não existência de um Joaquim Nabuco tenha a ver com o que escrevi no
texto anterior. Os liberais do império sabiam articular os antagonismos
sociais em prol da liberdade, como exemplificam a causa da escravidão e a
do voto universal. Os problemas da época eram outros. Quando eleitos,
os liberais acabavam fazendo mais concessões do que levantando a
bandeira liberal. Nabuco reclamava do eclipse intelectual do
liberalismo:
"Vejo uma situação liberal, um partido liberal, homens liberais, mas não vejo ideias liberais."
Hoje
podemos dizer quase que o contário. Vemos ideias liberais em
circulação, mas faltam partidos e pessoas para empunhar essas ideias.
Faltam novos Nabucos.
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